sexta-feira, 13 de agosto de 2010

O que tem sido "normal" para você??

Há poucos dias estive em São Paulo, e presenciei uma cena que me marcou:
Estava com alguns amigos no carro, quando um deles (Tiago) viu do outro lado da rua um mendigo dormindo no chão, interrompeu a conversa e disse com a voz triste: "Poxa, que pena isso hein!" - referindo-se a condição do mendigo.
Me marcou primeiro por que aquela cena aparentemente "comum" despertava a atenção do Tiago e o incomodava. Claro, todos nós nos incomodamos com essas cenas de miséria, mas ele de longe enxergou aquele homem do outro lado da avenida, parou a conversa, e comentou sobre a tristeza de tais cenas. Naquele momento o Tiago não viu um mendigo, simplesmente. Viu um homem, como ele, que merece dignidade. Apenas ele prestou atenção naquele homem, se incomodou, comentou, e não apenas passou por lá tratando aquilo como algo normal. 

Como aquilo me engrandeceu!!!
Tantas vezes nos acostumamos com certas coisas que não poderiam tornar-se "comuns" para nós. 
Não pode ser "normal" estarmos comendo num restaurante caro quando na porta dele tem um homem catando alimento no lixo; agindo, infelizmente, como os animais... 
Não podemos nos acostumar com certas cenas, certas "verdades". Penso que elas precisam nos inquietar!
Me preocupa o que vamos tratando como coisas "normais".
"É normal" ver gente sem um mínimo de dignidade nas ruas, dormindo cobertos por um jornal num frio lascado, catando lixo, comendo nossos restos, adoecendo e morrendo por aí...

Naquele instante recordei uma história que li no livro “Qual é a tua obra?”, de Mário Sérgio Cortella. 
O autor narra a visita de dois caciques Xavantes a São Paulo em 1974. Na época os xavantes não utilizavam dinheiro ainda na tribo, a “moeda” de valor deles era alimento.

Nós os levamos também a um lugar magnífico, o Mercado Municipal, na área central. E no Mercado Municipal é comida para todo o lado. Eles deram dois passos e ficaram pasmos. Pilhas de alface, de tomates, de cenoura, de laranja. Ficaram com o olhar talvez como o nosso olhar ficaria se entrássemos no cofre de um banco. Em certo momento, um deles viu uma coisa que nenhum e nenhuma de nós veria. Ele cutucou e perguntou: “O que ele está fazendo?” E apontou no chão um menino negro, pobre (a gente sabia que era pobre por causa da roupa, ele não saberia) pegando alface pisada, tomate estragado, batata já moída e colocando num saquinho. Nenhum e nenhuma de nós veria aquilo, pois para nós era normal. Normal? Cuidado com o conceito de normal.

Nós falamos: “Ué, ele está pegando comida”. O cacique não disse mais nada. Ele continuou andando conosco, mas não prestou atenção em mais nada. Depois de uns 15 minutos, ele falou:
- Eu não entendi. Por que ele está pegando essa comida estragada aqui no chão, se tem essa pilha de comida boa?
- É que para pegar comida dessa pilha aqui precisa de dinheiro.
- E ele não tem dinheiro?
- Não tem.
- Por que não tem dinheiro? – indagava o cacique.
No que ele está cutucando? Na nossa base ética, no nosso valor de vida. A gente acha que uma criança com fome, mesmo diante de uma pilha de comida boa, pode comer comida estragada. Porque a vida é assim. É normal.
- Ele não tem dinheiro porque ele é criança.
- E o pai dele tem?
- Não, o pai dele não tem.
- Não entendi. Por que você, que é grande, tem e o pai dele, que é grande, não tem? De qual pilha você come, dessa daqui ou a do chão?
- Dessa daqui.
- Por quê?
A única resposta possível para o cacique naquele momento foi a resposta que algumas pessoas que já desistiram dão: “Sabe o que é? É que aqui é assim“…
Os dois índios, diante da resposta, falaram uma coisa de que eu nunca mais esqueci. “Vamos embora.” Não é que eles pediram para ir embora do mercado, eles pediram para ir embora de São Paulo. Veja como eles são “selvagens”. 

Acredito que são essas pequenas coisas que vamos tratando como "comuns" que vão roubando tantos valores de nossa vida.
Vamos perdendo o senso crítico, vamos acolhendo qualquer coisa, nos conformando facilmente com a injustiça, com a miséria, com a traição, com a falta de perdão, com o ódio...
Aos poucos vamos nos conformando ao que é TOTALMENTE contrário a essência do homem: a bondade, o amor, para o qual nascemos.
Precisamos nos questionar a cerca do que estamos acolhendo como "normal".
Precisamos deixar nosso coração lançar um olhar crítico sobre tantas injustiças e incoerências de nosso dia a dia. Não podemos viver de qualquer forma. Não somos quaisquer pessoas!
A felicidade é para mim, para você, e também para aquele que agora está na rua totalmente abandonado.

Chega de dizer que isso é problema apenas dos políticos!
Isso é problema meu também!
O que podemos fazer?
Também não tenho a receita... mas acredito que devemos lançar um olhar de amor, e movidos pelo amor certamente encontraremos uma forma de fazer a diferença, conforme nossas possibilidades... 

Tem aquela história "boba", antiga: Talvez o que esteja sobrando em minha casa, esteja faltando em algum lugar.
Talvez um bom primeiro passo seja ir ao encontro desses, dar um simples agasalho, e dar também nosso olhar, nosso sorriso, nosso abraço, nossa atenção.

"Seja a diferença que você deseja ver"

sábado, 7 de agosto de 2010

Como eu amaria dançar com meu Pai novamente!

"If I could get another chance
Another walk, another dance with him
I’d play a song that would never, ever end
How I’d love, love, love to dance with my father again"
Às vésperas do Dia dos Pais é impossível não recordar tantas coisas que vivi com meu pai...
Meu pai era muito espontâneo e intenso. 
Lembro das inúmeras vezes que ele me encontrava e beijava todo o meu rosto sem parar... me cobrindo da certeza de que ele estava com saudades!
Lembro do seu choro compulsivo várias vezes em que o presenteei com cartas, ou surpresinhas, em dias "comuns".
Lembro do seu olhar quando eu fazia algo bom, conquistava algo, ou mesmo quando dava uma idéia que ele achava "brilhante". Seu olhar de admiração, de orgulho, de felicidade fazia com que eu me sentisse realmente importante.
Lembro também das brigas, dos momentos que com firmeza ele me corrigia e me questionava sobre quem eu estava sendo e o que eu estava fazendo com minha vida.
Mas algo em especial eu lembro hoje.... do quanto ele gostava de dançar!
Quando eu era adolescente sentia até vergonha porque ele insistia em dançar comigo, e ficava envergonhada de dançar "com meu pai" numa festa. Parecia que todo mundo estava me olhando. A gente se importa com cada bobagem quando é adolescente!!Sem dúvida ele era o homem mais interessante com quem naquelas festas eu deveria dançar... Mas eu não sabia disso...
Algumas vezes tinha vergonha da forma intensa como ele me beijava na frente dos meus amigos, me abraçava sem parar, ficava me elogiando, e me chamava para dançar toda hora. 

Graças a Deus o tempo passou... fui crescendo e a vergonha foi passando, e muuuuuitas vezes eu pude dançar com aquele homem, que me olhava como ninguém nunca me olhou, que me acolhia em seus braços como ninguém nunca me acolheu, que sorria um riso tão bonito, e que me deixava na cadeira ao término da dança com um ar de homem mais satisfeito do mundo!
Meu pai tinha uma capacidade incrível de fazer com que eu me sentisse a pessoa mais importante e amada do mundo!
Há alguns anos perdi o meu pai, mas graças a Deus eu pude viver tudo com ele antes dele falecer. 
Brigamos, fizemos as pases, choramos, sorrimos, cantamos, brincamos bastante (de lobo mau, e tantas coisas mais), cantamos, rezamos, perdoamo-nos, amamo-nos e construímos em meio a dores e alegrias uma história de amor muito bonita, a meu ver.

Hoje, se eu pudesse pedir algo a Deus, pediria que eu dançasse com ele só mais uma vez.
Dessa vez eu quem iria tirar um homem para dançar pela primeira vez. Queria poder ir devagar ao seu encontro, com um sorriso apaixonado, e convidá-lo para dançar comigo.
Não precisaríamos de música alguma... Nosso coração certamente nos embalaria, meus pés não cansariam, e eu sentiria muito orgulho em dançar com o homem mais lindo da festa!

Infelizmente hoje isso não é mais possível... Que pena! Eu nunca tirei meu pai para dançar, nem nunca sorri e pulei da cadeira dizendo: "Claro papai, eu adoraria dançar com você!", mas consola-me saber que de muitas formas expressamos nosso amor.
A última noite que eu vi o meu pai ele estava doente, deitado na sala de casa porque não conseguia achar posição no quarto, e ele dormiu no meu colo. Naquele dia, vendo aquele homem que era tão essencial para mim naquela condição ali no meu colo, tão frágil, tão dono de si e tão meu ao mesmo tempo, o envolvi com meus braços e graças a Deus não pensei duas vezes e segui meu coração: cantei para ele dormir "Como é grande o meu amor por você". De fato eu tinha tanto a falar, mas com palavras era impossível dizer...
Eu jamais imaginaria que aquela seria nossa última noite juntos. Deus foi tão generoso que concluiu nossa história de amor com um belo final, muito mais do que eu merecia.

Com meu pai aprendi inúmeras coisas, mas gostaria de destacar algo:  
"O amor é agora, é urgente, não deve esperar o amanhã"
Não devemos sentir vergonha nem medo do amor. 
Quão belo é ser livre para correr ao encontro de quem amamos e dar um abraço, dizer "Eu te amo", expressar esse amor no dia a dia, sair para trabalhar e dizer a nossa mãe que não seríamos os mesmos sem ela, dar uma flor num dia qualquer, etc.
A você que porventura venha ler essa partilha, se é que eu posso sugerir algo, eu sugiro que você ame hoje, abrace hoje, e "dance" hoje de olhos fechados com as pessoas que de fato são importantes em sua vida, sobretudo nesse domingo, dia dos Pais.
Sorria, beije, abrace, cante, relembre histórias, brinque, seja feliz com seu pai nesse domingo!
Não apenas veja o seu pai. Faça desse momento um ENCONTRO de verdade.
Não perca tempo! Nada é mais importante na vida do que o amor.
Sei que para muitos o dia dos pais, das mães, etc., são apenas dias comerciais. Não importa! Aproveitemos essas "desculpas" para cuidar do que no dia a dia pode não estar sendo cuidado com a devida atenção.

Ao meu pai, meu herói, meu amigo, meu amado e até meu filho:
Minha eterna gratidão por teu amor, 
por tudo que me ensinaste com a tua forma tão intensa e concreta de amar, 
e por tudo que me fizeste desejar ser com teu olhar que sempre apostou em mim, 
muito mais do que eu mesma!
Ao recordar teu amor por mim, não é difícil entender que Deus, sendo Pai, é amor!
Amo-te eternamente!

 Tradução do trecho da música:
"Se eu pudesse ter outra chance
Outra caminhada, outra dança com ele
Eu tocaria uma canção que nunca, nunca iria acabar
Como eu amaria, amaria, amaria dançar com meu pai novamente"